Editorial
O valor da vida
A mistanásia é um termo
pouco utilizado nas conversas do dia a dia, mas, que, infelizmente, não está tão
distante de nossa realidade. A imprensa registra, sem filtros, o drama de
milhares de pacientes e profissionais nos postos de saúde, hospitais e
prontos-socorros e traduz a dura proximidade com a expressão.
O significado de mistanásia
remete à omissão de socorro, à negligência. Ela representa a morte miserável,
antes da hora. É conhecida como a eutanásia social. No Brasil, seu flagelo
atinge, sobretudo, os mais carentes,
que dependem exclusivamente do Estado quando o corpo padece. Um exemplo do que
a mistanásia pode causar apareceu em série de reportagens exibida pelo Jornal
Nacional (Rede Globo), em janeiro, que dissecou o drama dos pacientes com
câncer no país.
A falta de tudo torna a larga espera pelo atendimento um duro calvário e, em meio ao desespero, centros de excelência, como o Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Rio de Janeiro, minguam a céu aberto.
A falta de tudo torna a larga espera pelo atendimento um duro calvário e, em meio ao desespero, centros de excelência, como o Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Rio de Janeiro, minguam a céu aberto.
A falência do sistema
público de saúde não é só um fenômeno administrativo ou contábil. Quem dera o
fosse. Assim, seria mais fácil suportá-la, pois contas se arrumam. A questão é
que o desequilíbrio causado por uma gestão feita de pessoas perdidas em meio ao
tiroteio entrou em nossas casas pela porta da frente.
A situação grave, contornada com paliativos,
ceifa vidas, inclusive de crianças e jovens, impedidos de
receber aquilo que a Constituição lhes garante como direito cidadão: o acesso
universal, integral, gratuito e com equidade a serviços de saúde de qualidade.
Nesta edição do jornal
Medicina, apresentamos números do valor da vida e da saúde de cada brasileiro
para o setor público. A média nacional não supera os R$ 4,00 ao dia, ou seja,
quase nada se comparado a outros países com modelos assistenciais semelhantes.
Essa conta acentua a tragédia da morte
anunciada em corredores e filas de espera e suscita um questionamento
importante, pois os dados evidenciam que, apesar
do pouco destinado, é o mau uso dos recursos que estão disponíveis que
aprofunda a crise.
O Brasil está diante de um
dilema. É hora de rever caminhos, adotar novas posturas, corrigir falhas para
não sentenciar a população à doença e tirar do estado de coma em que se
encontra o Sistema Único de Saúde (SUS), uma das maiores políticas sociais do
mundo e balizador de todo modelo de atenção no País.
Jornal Medicina Publicação
oficial do Conselho Federal de Medicina. Janeiro 2016.
Questões
1. Por se tratar de
editorial, o texto
a) se exime de assumir
posição a respeito da crise da saúde no Brasil e apresenta narração de
episódios graves atinentes à população menos favorecida.
b) manifesta opinião do
jornal sobre a crise na saúde e defende ponto de vista para corrigir problemas
que a afetam, especialmente em relação aos mais carentes.
c) apresenta postura do
jornal em relação à mistanásia e considera irrelevante o amplo e irrestrito
acesso a serviços de saúde de qualidade.
D) registra ideias dos
médicos de um modo geral sobre a saúde em âmbito nacional e se atém a lamentar
os casos veiculados na Rede Globo.
2. “Quem dera o fosse.” Os
verbos empregados nessa frase do quarto parágrafo (verbo dar no pretérito mais-que-perfeito
do indicativo e verbo ir no pretérito imperfeito do subjuntivo) contribuem para
construir o sentido de que
a) o fenômeno administrativo
e contábil gerado pelo desequilíbrio da gestão do sistema público de saúde
levou o país à falência.
b) o problema com a saúde nacional se
circunscreve a questões de natureza administrativa ou contábil.
c) a situação em que se
encontra o sistema público de saúde não se restringe a questões de natureza
administrativa ou contábil.
d) a falência do sistema
público de saúde brasileiro se resolve pela gestão equilibrada das contas.
3. Indique o referente
textual a que o pronome destacado faz remissão [5.º parágrafo]: “A situação
grave, contornada com paliativos, ceifa vidas, inclusive de crianças e jovens,
impedidos de receber aquilo que a Constituição lhes garante como direito cidadão: o acesso universal, integral,
gratuito e com equidade a serviços de saúde de qualidade.”
a) Jovens.
b) Crianças e jovens.
c) Crianças.
d) Paliativos e vidas.
4. De acordo com a ordem em
que aparecem, os elementos conectores destacados ao longo do editorial
estabelecem relações de sentido de
a) destaque, inclusão e
reafirmação.
b) exceção, essencialidade e
contraste.
c) inclusão, contraste e
oposição.
d) destaque, inclusão e
adversidade.
5. “[...] estado de coma em
que se encontra o Sistema Único de Saúde [...]” Nesse trecho do último
parágrafo, a metáfora médica foi empregada para significar que o SUS
a) está muito mal.
b) é o único responsável
pelos problemas com a saúde no Brasil.
c) não tem solução.
d) está se recuperando
Respostas
1.
O editorial trata, de forma crítica, da
falência do sistema público da saúde brasileira, exigindo providências que
solucionem a grave crise. Resposta: B
2.
O editorial deixa evidente que a crise no
sistema de saúde vai além de questões de ordem administrativa ou contábil, daí
o lamento do autor na frase: “Quem dera o fosse”. Para ele, trata-se de algo
mais amplo que diz respeito a um contexto caótico do próprio país que afeta o
sistema de saúde pública. Resposta: C
3.
O pronome “lhes” retoma os termos “crianças e
jovens”, que, segundo o texto, são alijados do serviço de saúde pública de
qualidade. Resposta: B
4.
O conectivo “sobretudo” evidencia que a crise
na saúde atinge principalmente os cidadãos brasileiros mais carentes. O
conectivo “inclusive” engloba “crianças e jovens” no grupo dos pacientes
fatais. A locução concessiva “apesar de” marca adversidade: embora haja pouco recurso
destinado, é o uso indevido dos recursos que estão disponíveis que aprofunda a
crise. Resposta: D
5.
A metáfora “estado de coma” sugere o péssimo
estado da saúde pública, ainda que reversível, caso sejam adotadas novas
atitudes por parte dos gestores. Resposta: A
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